O Projeto Lean nas Emergências vem para solucionar ou pelo menos mitigar um dos mais antigos e graves problemas na saúde pública brasileira, a superlotação dos hospitais.
Essa é uma medida que vem dando ótimos resultados, principalmente porque ajuda a salvar vidas.
Sim, a expressão é essa mesma – salvar vidas -, pois a realidade aponta para uma realidade preocupante.
Não são poucos os casos de pacientes que morrem porque têm atendimento negado ou demasiadamente demorado nos pronto-socorros Brasil afora.
Aliás, esse é um risco que até mesmo quem tem plano de saúde pode correr.
Por isso, a iniciativa de implementar o conceito Lean nas unidades de saúde é das mais louváveis.
A expectativa é para que, no final do projeto, uma parte expressiva da rede de atendimento de emergência no Brasil esteja totalmente recuperada.
É, sem dúvida, uma boa notícia em meio a tantos problemas no setor.
Além disso, trata-se de um excelente estudo de caso para profissionais de saúde e gestores, da área de saúde ou de outros segmentos.
Continue lendo para saber como esse incrível projeto está mudando a realidade dos principais serviços de atendimento de urgência médica pública.
O que é o Projeto Lean nas Emergências
Não é de hoje que a saúde pública brasileira sofre com diversos problemas, muitos deles causados pela gestão ineficaz ou mesmo a falta dela.
Nesse contexto, as unidades hospitalares e, por consequência, profissionais de saúde e paciente são afetados pela falta de remédios, médicos e leitos.
Esse panorama caótico, como não poderia deixar de ser, faz com que os serviços de saúde prestados pelo governo sejam muito mal avaliados pela população.
Se o SUS, o Sistema Único de Saúde, fosse uma empresa, possivelmente, já teria fechado as portas.
Esses são motivos que justificam uma intervenção enérgica, mas, acima de tudo, bem pensada e articulada.
Essa articulação é fundamental, já que abre portas para parceiros com experiência em gestão hospitalar e que apoiem na implementação do conceito Lean nas Emergências.
Assim, ganha vida um projeto que tem como objetivo reestruturar 100 serviços de emergência entre 2018 e 2020.
Liderado pelo Ministério da Saúde, é conduzido pelo Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (Proadi/SUS), em parceria com o Hospital Sírio-Libanês.
Desde o ano passado, conquistas expressivas já foram registradas.
Uma delas é a redução de 45% do tempo de espera nas emergências em que o projeto já foi implementado.
Vantagem do Lean nas Emergências
Mas o que o Projeto Lean nas Emergências tem de diferente em relação às tentativas passadas de melhorar a saúde pública?
Se você tem essa dúvida, vale relembrar o que a metodologia Lean proporcionou, no passado, para outras empresas fora da área da saúde.
Na verdade, ela nasce no Japão, como resultado do gigantesco esforço de recuperação do parque industrial do país depois da Segunda Guerra Mundial.
Seus idealizadores são Taiichi Ohno e Eiji Toyoda, então colaboradores da Toyota, que fabrica o carro mais vendido de todos os tempos, o Corolla.
Essa marca, por si só, já diz muito do que a aplicação das práticas Lean é capaz.
Vamos lembrar que a fabricante de carros, depois da guerra, estava arrasada, assim como o Japão. Faltava tudo: mão de obra, insumos, infraestrutura e até clientes.
Parece milagre a recuperação da Toyota, mas, acredite, de mística ela não tem nada – embora, claro, uma boa dose de fé seja sempre necessária.
E se uma fábrica de carros em um país devastado pelo maior conflito armado da história da humanidade conseguiu se levantar, por que o mesmo não pode acontecer no Brasil?
Essa é, portanto, a grande vantagem da implementação da metodologia nas emergências.
Como fez a Toyota, ela se ocupa de eliminar o desperdício, tornando os processos mais enxutos, como já deixa claro a tradução do termo Lean.
No caso dos japoneses, a ideia era extrair o máximo dos recursos disponíveis, considerando a escassez do período pós-guerra.
Deu certo por lá e tem tudo para ser um sucesso em nosso país.
Plataforma Oficial do Lean nas Emergências
Todas as informações sobre o Projeto Lean nas Emergências estão disponíveis no site do MS.
Afinal, um projeto dessa magnitude não poderia deixar de contar com um portal informativo, até porque isso faz parte da própria aplicação dos princípios de gestão Lean.
Lá está exposto o seu objetivo principal:
“Reduzir a superlotação nas urgências e emergências de hospitais públicos e filantrópicos por meio do uso da metodologia Lean. Essa metodologia visa melhorar a gestão racionalizando recursos, otimizando espaços e insumos.”
Reparou que, além dos hospitais públicos, também estão contempladas unidades de saúde filantrópicas?
Incluindo os hospitais sem fins lucrativos, o MS sinaliza que está empenhado em ampliar o máximo possível o alcance do projeto.
Por outro lado, ser um programa abrangente não significa que qualquer hospital pode participar.
Isso fica claro pelos critérios de elegibilidade estipulados, dos quais falaremos com mais detalhes alguns tópicos à frente.
A propósito, a plataforma online oficial do Projeto Lean nas Emergências contém uma série de informações sobre os métodos e ferramentas empregadas.
Também conta com vídeos nos quais profissionais e pessoas envolvidas na sua implementação dão depoimentos sobre o que viram.
Vale a pena assistir após a leitura deste artigo!
Exemplos de Hospitais que Implementaram o Lean e Os Resultados Obtidos
Até agora, segundo o Ministério da Saúde, 16 hospitais já participaram do projeto, totalizando 11 estados brasileiros.
São eles:
UF | MUNICÍPIO | HOSPITAL |
CE | Fortaleza | Hospital de Messejana |
DF | Brasília | Hospital de Base do Distrito Federal |
DF | Ceilândia | Hospital Regional de Ceilândia |
ES | Vitória | Hospital Estadual Dr. Jayme Santos Neves |
GO | Goiânia | Hospital de Urgências Gov. Otávio Lage de Siqueira |
MG | Belo Horizonte | Hospital Metropolitano Odilon Behrens |
MG | Uberlândia | Hospital de Clínicas de Uberlândia |
PR | Curitiba | Hospital universitário Estadual de Londrina |
PR | Curitiba | Hospital do Trabalhador de Curitiba |
RR | Boa Vista | Hospital Geral de Roraima |
RS | Passo Fundo | Hospital Cidade Passo Fundo |
SC | São José | Hospital Regional São José |
SP | São Paulo | Hospital Geral do Grajaú |
SP | São Paulo | Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de SP |
SP | Guarulhos | Hospital Geral de Guarulhos |
TO | Palmas | Hospital Geral de Palmas |
Os números, até agora, apontam para o sucesso do programa, que reduziu o tempo de espera de 3 para 1h30 nas unidades em que a implementação foi concluída.
De acordo com o site do MS:
“Considerando o período desde a entrada na unidade de saúde, passando pela triagem, consulta, administração de medicamentos e exames, até a alta médica, o paciente que busca atendimento nessas emergências passa, agora, duas horas a menos no pronto-socorro – uma redução de 37%, passando de 7h para 5h.”
Critérios de Elegibilidade para participar do Programa de Intervenção do Governo
Embora boa parte da rede pública de saúde do Brasil precise de reformas, não são todas as unidades de emergência que estão aptas a participar do projeto.
Nesse aspecto, o primeiro ponto a ser observado é a periodicidade do programa, que abre inscrições semestrais.
Assim sendo, antes de começar um novo ciclo, o hospital equipado com emergência que tenha interesse em aderir deve fazer a sua inscrição observando esse prazo.
No entanto, só o interesse não basta para ser escolhido e receber as melhorias do projeto. Antes de mais nada, é necessário reunir uma série de pré-requisitos indispensáveis.
Essas exigências, por sua vez, são feitas considerando certas características da emergência, governança institucional e a estrutura da unidade de saúde.
Para sintetizar, o site do Projeto Lean nas Emergências lista os problemas a serem solucionados pela implementação das ações. São eles:
Serviços de urgência (Pronto Socorro) sempre lotados
Dificuldade de internação de pacientes
Recusa de recebimento de ambulâncias
Transporte fragmentado e desorganizado
Ausência de atendimento especializado
Atendimento e lotação nos serviços de urgência de pacientes de baixo risco
As exigências, como já destacamos, são subdivididas em três blocos, cada um com um grupo de critérios a serem observados.
Elas se distribuem assim:
Estrutura
Hospital com mais de 150 leitos e referência regional conhecida
Ter leitos de terapia intensiva
Ser público ou filantrópico
Localização em regiões metropolitanas, capitais ou referência regional relevante
Porta aberta de emergência ou com referência formal para redes temáticas
Integração com a rede de urgência, emergência ou regulação.
Governança Institucional
Engajamento de equipe de emergência na visita de elegibilidade
Termo de compromisso acordado e assinado.
Características da Emergência
Estrutura física de vigilância sanitária
Ter classificação de riscos
Contar com coordenação de emergência
Estar superlotada
Escala médica fixa
Gestão de leitos
Núcleo interno de regulação
Monitoramento de tempo e dados
Sistema informatizado (Tasy, MV Soul, Guardião ou similares)
Plantão Horizontal
Atender por protocolos clínicos assistenciais (Trauma Maior, AVC, IAM, SEPSE)
Serviço de SADT interno.
No momento, o projeto Lean nas Emergências encontra-se em seu quarto ciclo.
Em 2020, mais 30 unidades de saúde serão selecionadas para participar, sendo 20 no primeiro semestre e as outras 10 no segundo.
No próximo ciclo, participarão as seguintes unidades hospitalares de emergência:
UF | MUNICÍPIO | UNIDADE DE SAÚDE |
BA | Salvador | Hospital Municipal de Salvador |
DF | Distrito Federal | Hospital Regional de Taguatinga |
RS | Porto Alegre | Hospital de Clínicas de Porto Alegre |
BA | Salvador | Hospital do Subúrbio |
PR | Londrina | Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Londrina |
CE | Fortaleza | Hospital Geral Dr. César Cals |
MG | Montes Claros | Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Montes Claros |
PA | Belém | Hospital Ophir Loyola |
ES | Vitória | Hospital Estadual de Urgência e Emergência |
PI | Teresina | Hospital de Urgência de Teresina |
AL | Maceió | Hospital Geral do Estado de Alagoas |
SC | Joinville | Hospital Regional Hans Dieter Schmidt |
PE | Recife | Hospital Agamenon Magalhães |
MA | São Luís | Hospital Municipal Dr. Clementino Moura |
MG | Belo Horizonte | Hospital das Clínicas da Univ. Federal de Minas Gerais |
RS | Porto Alegre | Associação Hospitalar Vila Nova |
SC | Joinville | Hospital Municipal São José |
BA | Salvador | Hospital Geral Roberto Santos |
ES | Vila Velha | Hospital Antônio Bezerra de Farias |
PR | Cascavel | Hospital Universitário do Oeste do Paraná |
Como Implementar o Lean no Meu Hospital: Passo a Passo
Vimos que o Projeto Lean nas Emergências pode mudar para a melhor a “cara” dos serviços de saúde pública brasileiros.
Contudo, infelizmente nem todos os hospitais podem participar, seja por não atenderem às exigências do programa ou porque não são da rede pública ou filantrópica.
Isso significa que unidades de saúde de outros tipos não podem implementar seus próprios projetos com metodologia Lean?
Com certeza, não.
Todo e qualquer hospital pode se beneficiar desse conjunto de práticas que, desde que foi adaptado à área da saúde, vem trazendo melhorias em todos os sentidos.
Portanto, se você é gestor ou trabalha no ramo hospitalar ou clínico, saiba que os princípios Lean também são para a sua empresa.
E se você gostaria de se capacitar para implementar um projeto Lean como o do Ministério da Saúde, pode matricular-se no Curso Lean Healthcare, da Escola EDTI.
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Dito isso, veja na sequência quais são as etapas básicas para implementar a metodologia Lean em um passo a passo resumido.
Reunir a equipe
O primeiro passo consiste em juntar as pessoas que farão parte do processo de mudança.
Em geral, um time composto por 8 a 10 profissionais é o suficiente.
Busque por pessoas com formações, experiências distintas e de setores variados.
Assim, você terá uma diversidade de opiniões e pontos de vista que serão úteis ao longo do projeto.
Essas pessoas não precisam ter experiência prévia em metodologia Lean nem saber exatamente o que deverá melhorar.
O mais importante é que elas conheçam a realidade da emergência e que estejam motivadas o bastante para contribuir com ideias e, claro, com muito trabalho.
Identificar os processos
A “cartilha” Lean diz que a mudança deve começar pelo processo que mais gera problemas para os clientes/pacientes.
Esses processos, por sua vez, podem ser identificados por meio de reclamações, SAC ou pesquisas.
No entanto, nem todos os hospitais contam com esse tipo de informação ou não têm meios para coletar e organizar estudos junto aos seus clientes.
Na falta de dados, caberá à equipe usar o bom senso para escolher um processo que seja problemático, mas que possa ser melhorado com os recursos disponíveis.
Qualificação dos processos
Nessa etapa, a equipe Lean deverá estar engajada na resolução de problemas dos processos a serem melhorados.
É a fase da observação atenta, dos registros minuciosos e da identificação de falhas e oportunidades.
Pode ser, por exemplo, que o processo de triagem de pacientes esteja mais lento do que deveria.
Ou, ainda, é possível que os profissionais de atendimento não sejam qualificados o bastante para prestar um atendimento ágil.
Caberá aos profissionais envolvidos registrar tudo que pode ser redesenhado e, assim, reduzir o desperdício de tempo, recursos e o esforço.
Reconhecer onde está o valor
Passadas as etapas iniciais, é hora de se aprofundar na implementação das mudanças, identificando quem são os clientes envolvidos e o valor que cada processo representa.
Aqui, a equipe deverá tratar não apenas dos pacientes, mas de todos os profissionais de saúde que participem de um processo, do início ao fim.
Por exemplo, pode-se considerar o processo que leva um paciente a fazer um exame. Quem são as pessoas envolvidas e onde está o valor?
Para o paciente, o valor está em exames precisos, seguros e rápidos.
Já para os profissionais de apoio, valor é contar com infraestrutura adequada, equipamentos sempre em bom estado e horários flexíveis para trabalhar.
Por fim, médicos percebem valor quando o processo de um exame fornece resultados totalmente confiáveis e em tempo hábil para prescrição de tratamentos.
Mapeamento
Uma vez que a equipe Lean tenha um overview da situação, poderá então mapear os processos do jeito que se encontram.
É a hora de fazer o mapa de processos por meio de ferramentas gráficas como a notação BPMN ou fluxograma.
Basicamente, consiste em desenhar o processo pelas suas entradas, saídas e o que acontece entre uma e outra.
Por exemplo:
Entrada Processo Saída:
Ambulância → Triagem → Primeiro atendimento Alta/Tratamento → Internação
Paciente → Recepção → Triagem → Primeiro atendimento Alta/Tratamento → Cirurgia
Exames → Segundo atendimento Alta/Tratamento → Saída
Medicação → Alta/Tratamento.
Identificar perdas e criar novos fluxos
Uma vez que a equipe tenha uma visão clara de como estão os processos de atendimento e feito o mapeamento, é hora de encontrar respostas.
Essas respostas deverão ser obtidas a partir da formulação de hipóteses, ou seja, de questões que deverão ser respondidas e solucionadas pelo ponto de vista do cliente.
Pode-se questionar, por exemplo, o tempo de espera ou mesmo as fases mais complicadas do atendimento, desde a recepção até a saída do paciente.
Nessa etapa, o fundamental é observar e transformar em números os problemas observados.
Será a partir desses números que a mudança em si deverá começar.
Preparar para os momentos críticos
A essa altura, a equipe já terá uma visão clara dos problemas e poderá adotar medidas de contenção, reduzindo os impactos dos processos mal estruturados.
Saberá, ainda, como agir nos horários mais críticos, podendo assim alocar mais profissionais para apoiar ou agilizar o atendimento.
Permanecer em melhoria contínua
Claro que o projeto Lean não acaba quando se conquista a melhoria em um primeiro ciclo de mapeamento de processos.
Uma vez que a equipe pioneira fique “craque” e saiba o que fazer para melhorar os pontos críticos, é hora de repassar o conhecimento adquirido.
Por isso, ela poderá atuar como consultora para outros profissionais e perpetuar as práticas implementadas.
Assim o ciclo Lean volta ao início, em projetos nos quais o aprimoramento é constante.
Conclusão
O Projeto Lean nas Emergências é uma das mais importantes iniciativas em prol da saúde pública da história recente do Brasil.
Seu mérito é justamente otimizar o atendimento com os recursos que já estão disponíveis, melhorando o padrão e reduzindo as perdas.
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Afinal, de nada adianta contratar mais médicos e adquirir equipamentos e remédios quando os processos são deficitários e imprevisíveis.
E você, o que pensa sobre o assunto?
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