Hoje quero retomar um tema que, apesar de muito falado, continua sendo pouco compreendido e pior ainda: mal aplicado. Estou falando da famosa “satisfação do cliente”. À primeira vista, ninguém discorda da importância de ouvir o cliente. A frase virou quase um mantra nas organizações: “precisamos ouvir o cliente”. Mas será que realmente sabemos o que isso significa? E mais: será que estamos fazendo isso da maneira certa?
Em muitos contextos, “ouvir o cliente” se transformou em uma expressão vazia, daquelas que a gente repete em reuniões e apresentações, mas que não se traduzem em ações concretas no dia a dia das empresas. É um daqueles conceitos que são mais citados do que realmente colocados em prática com profundidade. Já participamos de incontáveis palestras, treinamentos e workshops sobre experiência do cliente. Mas pare para pensar: quantas vezes esses encontros nos trouxeram ferramentas práticas, aplicáveis, e — acima de tudo — eficazes para entender verdadeiramente o que o cliente sente, pensa e precisa?
Pois é. O problema está justamente aí.
Como ouvir o cliente além da pesquisa de satisfação tradicional
Vamos direto ao ponto: muitas empresas aplicam pesquisas de satisfação que, na prática, pouco contribuem para a melhoria dos seus serviços ou produtos. E eu não estou falando apenas daquelas longas e maçantes, que o cliente já abandona na terceira pergunta. Falo também das pesquisas simples, até bonitinhas, mas que não entregam informação útil alguma.
Você provavelmente já se deparou com pesquisas do tipo “escolha uma carinha para classificar nosso atendimento”. Um conjunto de emojis variando do rosto irritado ao super sorridente. Parece moderno, direto, amigável. Mas o que essa pesquisa realmente diz para quem está tentando melhorar o negócio?
Imagine o seguinte cenário: 90% dos clientes clicam na carinha feliz. A equipe de atendimento se enche de orgulho: “Estamos mandando bem!” Mas… e os outros 10%? O que aconteceu? O que faltou? Aonde erramos? Ninguém sabe. A pesquisa cumpriu sua função estatística — mostrou um número — mas falhou miseravelmente em gerar aprendizado.
Agora pense num segundo cenário: 40% das pessoas avaliam mal o serviço. A resposta mais comum é uma combinação de duas atitudes, ambas problemáticas. A primeira: chamar a equipe para uma bronca, cobrando mudanças urgentes. A segunda: tentar agir rapidamente, implementando alterações às cegas, sem compreender as reais causas da insatisfação. O resultado? Desmotivação interna, medidas ineficazes e desperdício de recursos.
Não é exagero dizer que esse tipo de pesquisa pode até gerar mais problemas do que soluções. Em vez de orientar a melhoria, ela causa ansiedade e decisões equivocadas. Pior ainda, passa uma falsa sensação de que a empresa está “ouvindo o cliente”.
Mas, então, qual seria a alternativa?
Ouvir com intenção: a chave da escuta estratégica
Ouvir o cliente vai muito além de medir satisfação. É entender profundamente o que ele valoriza, onde estão suas dores e expectativas, quais os pontos de atrito e quais os momentos de encantamento. Para isso, é preciso um instrumento de escuta mais robusto, ainda que simples.
Uma boa pesquisa de satisfação não precisa ser longa. Ela precisa ser estratégica.
No nosso curso de Green Belt, por exemplo, decidimos redesenhar nossa abordagem de pesquisa. Ao invés de utilizar um modelo genérico, criamos um questionário com apenas 10 perguntas, mas cuidadosamente formuladas para apontar com clareza onde estavam os principais pontos de melhoria.
Entre os tópicos abordados estavam: clareza do conteúdo, didática dos instrutores, utilidade dos exercícios práticos, facilidade de acesso à plataforma e qualidade do material didático.
Foi justamente por meio das respostas a esse questionário que descobrimos um ponto crítico: nossos alunos sentiam falta de uma apostila mais didática e visual. Aquilo que para nós era um material completo e técnico, para o cliente era denso e difícil de consultar durante os estudos.
Munidos dessa informação, tomamos uma decisão estratégica: reestruturamos todo o conteúdo da apostila. Adicionamos ilustrações, simplificamos o vocabulário, incluímos exemplos do cotidiano e deixamos o layout mais agradável à leitura.
O resultado? Um aumento significativo no nosso NPS (Net Promoter Score), que chegou a 85 nas últimas turmas. Isso não teria sido possível com uma simples pesquisa de carinhas sorridentes. Foi o aprofundamento das perguntas e a escuta ativa que nos permitiram tomar decisões assertivas.
Confira nosso artigo sobre como aplicar o NPS com eficiência
O falso conforto da alta satisfação
É importante entender também que um alto índice de satisfação pode ser enganoso. Muitas empresas se acomodam quando veem números altos nas pesquisas. Isso é compreensível — é natural querer celebrar os acertos — mas é preciso ter cuidado com esse falso conforto.
A verdade é que clientes “satisfeitos” nem sempre são clientes fiéis. Satisfação é uma métrica superficial quando analisada sozinha. O que realmente importa é o nível de lealdade e o potencial de recomendação. É por isso que métricas como o NPS ganham tanta relevância: elas indicam não só se o cliente está satisfeito, mas se ele está disposto a indicar sua empresa para outras pessoas.
Portanto, mesmo que a maioria dos seus clientes esteja “satisfeita”, continue buscando oportunidades de melhoria. A escuta ativa e contínua é o que diferencia empresas inovadoras daquelas que apenas “cumpriram o básico”.
Boas práticas para medir a satisfação do cliente com eficácia
Se você quer começar a ouvir o cliente de maneira eficaz, aqui vão algumas orientações práticas:
- Defina seu objetivo com clareza. Você quer medir a satisfação geral ou entender problemas específicos de um processo?
- Use perguntas abertas e fechadas. Perguntas abertas permitem que o cliente explique com suas próprias palavras. Já as fechadas ajudam na análise estatística.
- Evite jargões. Use linguagem clara, acessível e direta.
- Seja breve, mas completo. Ninguém quer perder 20 minutos respondendo uma pesquisa. Mas também não adianta fazer uma de três perguntas que não dizem nada.
- Inclua perguntas que tragam insights. Por exemplo:
- “Qual foi o ponto alto da sua experiência conosco?”
- “O que poderíamos ter feito melhor?”
- “Você recomendaria nossa empresa a um amigo? Por quê?”
- Feche com um convite à continuidade. Algo como: “Se quiser compartilhar mais, envie um e-mail para…”. Assim, você abre espaço para clientes mais engajados contribuírem ainda mais.

Cultura de melhoria contínua começa na escuta
Por fim, é importante reforçar que ouvir o cliente de verdade exige humildade, disposição e consistência. Muitas vezes, o que vamos ouvir pode ser desconfortável — e está tudo bem. É a partir do desconforto que surgem as melhores transformações.
Criar uma cultura de escuta significa encarar a crítica como um presente, e não como uma ameaça. Significa entender que toda experiência negativa apontada é uma chance real de melhoria. Significa agir com foco na satisfação do cliente e com inteligência estratégica, sem precipitação e sem decisões baseadas apenas na emoção do momento.
Se você está realmente comprometido com a excelência, precisa aprender a ouvir com intenção e agir com propósito. E isso começa com uma simples pergunta: “O que meu cliente está tentando me dizer?”
Pingback: Prova de Conceito: O que é e Como Usar a PoC com Exemplos
Pingback: Como fazer um diagrama de afinidades para seu projeto!
Pingback: Curso Green Belt: o que é, para que serve e onde fazer